Desvios precoces
12/11/2018
Foto: Bing Wright
Eu sempre soube que esta estrada de chão um dia se apagaria. E eu costumava ter certeza de como isso aconteceria, sabia exatamente o que levaria as pessoas a deixarem de usar esse caminho e quais pegadas seriam as últimas a aparecer pela trilha. Mas eu não poderia estar mais enganada.
O abandono veio de onde menos esperávamos. E veio cedo, tão cedo. O fio de vida que serviria como referência para a morte de todo o resto ainda nem se rompeu. Por que estão extinguindo a existência antes que a vida termine? A solidão da morte é natural e vem com o tempo. A solidão em vida é isolamento inútil, criado apenas para o sofrimento alheio.
Não digo que essa foi a intenção, pois quero acreditar que a dor causada não foi proposital. Mas quero que ela seja pensada. Quero que seja algo a se refletir. Há quanto tempo ouço essas mesmas bocas falarem de amor, essas que agora proferem palavras que rasgam meu coração? Sinto-me confusa. Eu aprendi que o amor era algo a ser cultivado, ainda que em tempos difíceis. Aprendi que deveríamos nos esforçar para que nada nos afastasse, para que a força desse elo que existe desde antes de nós, nunca se enfraquecesse. Aprendi que a união era essencial para superar as dificuldades, para criar forças, para amenizar o sofrimento. Aprendi que, juntos, poderíamos subir mais degraus. E que esses avanços não nos afastariam, mas nos manteriam cada vez mais unidos, chamando outros para integrarem um grupo cada vez maior. Um grupo que possuía como base de construção, o amor.
Mais de vinte anos ouvindo tais bocas falarem de amor e agora me deparo com o egoísmo imposto como certo. Será que a voz da calmaria se esqueceu de ouvir sobre o perdão? Será que tantas vozes podem ter se esquecido ao mesmo tempo? Será que sou a única que ainda acredita naquilo que todos nós pregávamos?
Eu tenho cada vez menos motivos para seguir. Todos os dias penso nisso. Todos os dias, listo as razões. Todos os dias, a lista fica menor. Todos os dias eu penso sobre como as coisas eram, como as coisas estão e como minha luta para manter tudo o que eu aprendi é inútil. Todos os dias, eu penso em desistir. Todos os dias, todos os dias.
Será que em algum desses dias, vocês pensaram sobre o que estão fazendo? Será que sabem o que estão causando? Será que esse pensamento está presente durante as suas orações?
Vocês deixaram.
Vocês soltaram nossas mãos.