Almas perdidas
10/10/2014
É estranho pensar em como a gente se perdeu. Como nossas mentes eram quase siamesas e agora somos simplesmente duas pessoas distintas, separadas e distantes. É engraçado pensar em como distância não tem absolutamente nada a ver com quilômetros geográficos e sim com corações fechados. A gente não mora tão longe assim, em pouco mais de uma hora eu estaria na sua casa - isso porque não dirijo - mas você poderia facilmente pegar o carro e me encontrar em menos de vinte minutos para a gente tomar um sorvete nesse calor.
Mas você não faria isso. Quando precisou buscar umas coisas lá em casa, aproveitou o horário em que eu estaria no trabalho, porque era o melhor horário para você ou porque era mais fácil. E eu não te culpo. Era mais fácil mesmo.
O que aconteceu com a gente, minha menina? Eu não sei mais quem é você, você não se contentou em apenas mudar o corte de cabelo, até seu riso parece diferente agora. Por onde a gente andou para chegar a estradas tão diferentes? A gente sempre brincou de imaginar o futuro de tantas formas diferentes, mas nunca desta. Não assim, nos tornando pessoas completamente desconhecidas. Eu te vejo rindo de coisas sérias e agindo de uma maneira que não reconheço, te observo de longe enquanto você empina o nariz e desfila por aí. Será que eu também me tornei alguém tão diferente do seu ponto de vista?
Eu continuo fazendo o meu melhor, continuo agindo com o coração sem esperar retornos. Eu te perdoei, embora você nunca tenha pedido perdão (aquelas desculpas levianas naquele jantar não contam, sei que foram repletas de mágoa e desprovidas de sinceridade. Não a culpo, o erro foi meu - ainda era cedo demais para cobrar por pedidos de desculpas).
Eu não te contei, mas estou escrevendo um novo romance e procurando um emprego novo. Você também arrumou um emprego e eu não fiquei sabendo. Uma pessoa da minha família morreu e outra nasceu, eu tive crises de sinusite aguda umas três vezes no último ano e fiz novos amigos. Você não sabe de nada disso. Eu também não sei dos seus altos e baixos, mas sei que com certeza você os teve. Mas a gente não vai conversar sobre isso. Também não vamos fazer cachorros-quentes e assistir a filmes antigos até você dormir no sofá, não vamos planejar a próxima festa de ano novo ou ir nadar naquele clube que você sempre dizia para irmos no fim de semana. A gente não vai fazer mais nada.
Hoje você já me chama pelo meu nome ao invés do apelido, mesmo sabendo como isso sempre me magoava. Daqui um tempo, a gente vai se cruzar na rua e não vamos saber o que fazer, se nos cumprimentamos ou evitamos o olhar. Talvez você pare e diga um oi cordial, ou talvez só desacelere o passo e murmure um "tudo bom?", depois siga o caminho. No lançamento do meu livro, vou te esperar na fila de autógrafos e você não vai estar lá. Daqui a dez anos, eu vou me lembrar apenas das coisas boas e você ainda remoerá as ruins. Em vinte anos, não lembrará mais meu nome.
Eu sinto sua falta.